Assombrações em Connecticut?


Uma Investigação por Joe Nickell

Pegue uma casa com cheiro de morte, traga para ela um “demonologista”, pague um escritor profissional para relatar e ampliar em páginas de um best seller os supostos fenômenos transformando-os em uma terrível história de horror. Pegue o livro e transforme em um filme de Hollywood e use à exaustão o termo “baseado em fatos reais” mundo afora durante a promoção dos mesmos. Essa fórmula funcionou muito bem e gerou filmes e livros de sucesso como no caso do Horror em Amityville em 1979 e funciona muito bem agora com o filme Evocando Espíritos, “baseado em uma história real” que irá entreter uma geração de cinéfilos e gerará muita renda para seus financiadores. Mas eis aqui um pouco da verdade com a qual me deparei durante minhas investigações sobre o caso entre os anos de 1992 e 1993.


Background

A mesma velha história. Em 1986 a família de Allen e Carmen Snedeker mudaram-se para uma nova casa, conhecida como a Casa Hallanan, em Southington, Connecticut. A família consistia em 3 filhos com as respectivas idades: 13, 11 e 3 (os 2 mais velhos sendo originários de um casamento anterior de Carmen) e uma menina de 6 anos; 2 sobrinhas depois se juntariam à eles.

Ainda é motivo de controvérsia se os Snedekers sabiam ou não que à casa para a qual se mudaram em 30 de junho havia sido uma Funerária. Eles ainda afirmam que não sabiam, mas alguns vizinhos insistem no contrário e que os antigos donos foram enfáticos ao relatar qual havia sido o uso anterior da casa para os novos donos muito antes dos mesmos se mudarem. De qualque maneira, a família logo descobriria no porão uma caixa de alças para caixões, uma corrente e polia usada para erquer caixões e uma mesa de drenagem de fluídos- sem dúvidas relíquias deixadas pela antiga função da casa, a Funerária Hallanan.

O cenário sinistro por si só poderia ter um efeito sugestivo muito poderoso sobre os novos moradores. Mas fenômenos estranhos começaram a acontecer com o filho mais velho, Philip, cujo quarto do porão era adjascente à área macabra. Logo ele começou a relatar avistamentos de fantasmas, apesar de no início os pais atribuirem essas visões ao tratamento à base de cobalto que ele recebia para tratar sua doença de Hodgkin's. A personalidade de Philip mudou radicalmente: Ele começou a usar roupas de couro, desenvolveu interesse em demonologia e chegou mesmo a invadir a casa de um vizinho, dizendo à mãe que o fez pois procurava uma arma pra poder matar o padastro. (Corica e Smith 1988; Rivard 1988; Carpenter 1988).


Supostamente o fenômeno prosseguiu por mais 2 anos. Uma sobrinha de 17 anos afirmou que uma mão invisível a havia acariciado quando a mesma deitara-se na cama, assim como muitas outras ocorrências, incluindo aparições, ruídos e ataques físicos- especialmente ataques sexuais demoníacos em Carmen Snedeker (Carpenter 1988; Corica e Smith 1988).

Foi quando os Snedekers trouxeram o “famoso” demonologista Ed Warren e sua esposa “sentitiva” Lorraine. O casal transformou o caso em um negócio – alguns até diriam “esquema”- de espíritos. Eles foram chamados de muitas coisas, indo de “religiosos e apaixonados” à “alarmistas” e mesmo “charlatães” (Duckett 1991). Os mesmos já haviam ajudado a promover o horror de “Amityville” e o similar “Pesadelo de West Pittston”, na Pennsylvania (Curran 1988), continuando seu modus operandi de chegar em uma suposta casa assombrada e transformar o caso em uma dominação “demoníaca”, através de seus dogmas tradicionais católicos. (Assim como os Lutzes de Amityville e os Smurls de West Pittston, os Snedekers se descreviam como católicos devotos.)

Trazendo com eles dois supostos “investigadores psíquicos” (Neto e Sobrinho dos Warren), Ed e Lorraine Warren mudaram-se para a casa por nove semanas. Durante o processo os mesmos negavam qualquer negociação para transformar a história em um livro, mas na verdade os pesquisadores já haviam feito tal acordo. A Sra. Snedeker já havia contado aos seus vizinhos do andar superior sobre o contrato, dizendo que ela e o esposo receberiam um terço dos lucros das vendas (Carpenter 1988; Corica and Smith 1988a, 1988b).

Ed e Lorraine Warren

Logo, tanto Al quanto Carmen Snedeker estavam publicamente afirmando que haviam sido estuprados e sodomizados por demônios- a mesma afirmação feita em casos anteriores investigados pelos Warrens (Nickell 1995, 131). Eles repetiriam essas afirmações em rede nacional nos programas de TV— especialmente no Sally Jessy Raphael Show— durante a promoção de seu livro com os Warrens, “In a Dark Place: The Story of a True Haunting” (Warren, et al. 1992)”. O livro foi escrito por um escritor professional de histórias de horror, Ray Garton e lançado— assim como a entrevista na TV— durante a promoção do Halloween de1992.



A Investigação

Apesar de anteriormente eu já ter aparecido ao lado de Carmen Snedeker no The Maury Povich Show (gravado em 2 de março de 1992), minha investigação se intensificou após receber uma cópia do livro ainda não lançado pelos Warren e Snedekers, através de um dos produtores do Sally Jessy Raphael, e do convite para participar do programa. Depois disso visitei Southington a convite de um dos vizinhos dos Snedekers.

No programa de TV (Exibido no Halloween de 1992) eu apareci com os Warren, os Snedekers, assim como muitos vizinhos céticos do casal. Ed fez ameaças veladas à mim (que não foram ao ar) e também fora do palco, usando palavras dignas de um estivador. Durante a gravação os Snedekers sentaram-se em uma cama enquanto contavam sua história de ataque sexual demoníaco.

Entre seus críticos mais incisivos estava a Senhora Kathy Altemus, que vivera no outro lado da rua durante todo o tempo em que os Snedekers residiram na Casa Hallahan. Começando em Julho de 1988, a Sra. Altemus manteve um diário dos fenômenos relacionados ao número 208 da Av. Meriden. Como ela disse no programa, “Descobri que coisas estavam acontecendo na vizinhança que explicavam as coisas que os Snedekers estavam publicando nos jornais” O diário— que ela generosamente compartilhou comigo numa tentativa de descobrir “a verdade”(Altemus 1993)—se justapõe com matérias de jornais copilados em ordem cronológica. O resultado foi revelador. Por exemploi, um dos especiais de TV sobre o caso mencionou o som de correntes sendo arrastadas pela casa, presumidamente da polia de erguer caixões no porão. Mas o diário da Sra.. Altemus’s mostra que o barulho poderia ser de um caminhão que sempre passava no local e fazia um ruído “como se estivesse arrastando uma enorme corrente”. Outros eventos também possuíam explicações críveis e simples, como por exemplo, truques e pegadinhas feitos pelos jovens da vizinhança, identificados no diário pelo título “Pregando Peças na Casa Assombrada” (Nickell 1995, 137, 147 n. 98).
caminhões que carregam caçamabas (como na imagem acima) fazem um barulho muito grande, especialmente suas correntes. Um caminhão desse tipo ou semelhante poderia muito bem ser o descrito no diário da vizinha dos Snedekers.


O diário também joga uma luz sobre outro evento. Sensacionalizado pelo jornal New Britain Herald, uma “bizarra coincidência ou um fantasma” fora responsabilizado por um blackout—causado por um galho de árvore que caiu sobre a rede elétrica no lado de fora da casa Hallahan logo após o documentário sobre o caso, A Current Affair, ter sido transmitido nacionalmente. De acordo com o jornalcomo é difícil explicar o porquê de um galho escolher aquele momento em particular para causar um apagão”. Na verdade, de fato, o incidente não ocorreu naquele exato momento mas aproximadamente duas horas depois do término do programa. Além disso, o diário deixa claro que tais apagões ocorriam normalmente devido ao grande número de árvores na avenida Meriden. Tal evento, na verdade, ocorreu quando eu estava em Southington na casa da família Altemu em junho de 1993. Parece difícil que as forças demoníacas estavam aguardando a minha chegada ou que poderiam estar de qualquer maneira tentando me expulsar do local.

Muito antes do programa de TV, em uma resposta a vergonhosa exploração midiática alimentada pelos Warren, a senhoria dos Snedekers— que já os havia mandado uma ordem de despejo por falta de pagamento— haviam respondido sobre os supostos relatos da família Snedeker. Ela e o merido, viveram na propriedade por pelo menos dois anos antes de colocá-la para locação e nunca experimentaram qualque fenômeno ou tiveram quaisquer problemas no local.

“Pessoalmente, eu e meu esposo não acreditamos em fantasmas e para nós toda essa história é ridícula. Acho extremamente irônico que muito depois dos dois anos em que eles viveram lá, fomos alertados sobre tais fantasmas e depois lemos nos jornais que os investigadores Warrens estariam fazendo um seminário sobre o caso e cobrando inscrições do público para o mesmo.”
“Se existem realmente fantasmas lá, então por que os Snedeker viveram lá por dois anos inteiros e por quê estão morando lá de novo? Estão procurando por publicidade ou o quê?” segundo palavras da proprietária (qtd. in DiMauro and Starmack 1989).

Os vizinhos do andar superior dos Snedekers também compartilham de opiniões similares. Disseram que os Warren eram “atores”. A vizinha disse: “Nunca experimentei nada sobrenatural na casa e definitivamente sei que ninguém foi atacado ou violentado, pelo menos aqui em cima” Ela disse à repórteres que os Warren, ela estava convencida que os mesmos exploravam a situação para benefício pessoal, “causaram muitos problemas aqui e não foram problemas fantasmagóricos” (Corica and Smith 1988b).

Outra informação relevante foi o uso de drogas por parte de Philip Snedeker, assim como vandalismo e outras tendências violentas. Houve até mesmo explicação para o toque que a sobrinha Carmen sentira de “Uma mão invisível”. O Garoto havia sido, de fato, pego acariciando as partes íntimas das sobrinhas enquanto as mesmas dormiam. “Steven” (como ele é chamado no livro) “foi levado pelos policiais esta tarde. Ele foi interrogado, e naquele momento confessou, que esteve acariciando as garotas enquanto elas dormiam à noite e que tentaram sem sucesso manter relações sexuais com a prima de 12 anos.” Posteriormente ele seria levado para o centro de detenção juvenil onde um psiquiatra o diagnosticou com esquizofrênia. (Warren et al. 1992, 145–147).


Conclusões

Muitos rotularam o livro de Warren-Snedeker-Garton como ficção. Segundo o marido da senhoria da residência dos Snedekers: “É uma fraude. Uma piada. Um boato, afinal, é Halloween”. Ele também disse que “É um esquema, uma máquina de dinheiro.” Esses comentários apareceram em um brilhante artigo de jornal chamado “Casal vê fantasmas; Céticos vêem através deles (Schmidt 1992).” Como indicado pelas evidências— as ações agressivas em busca de publicidade e o timing para o lançamento do livro no Halloween— existem fortes motivos para duvidar do interesse e sinceridade dos envolvidos. Se o caso não foi iniciado como uma fraude, certamente o casal será considerado culpado pelo caso ter se tornado em uma.

Estudos subsequentes serviram de apoio para minha conclusão. Um dos co-autores do livro dos Warrens admitiu que Ed Warren (falecido em 2006) pediu que criassem incidentes e novos detalhes no caso para tornar a história mais assustadora (Nickell 2006). Ray Garton, escritor prêmiado de livros de horror, escreveu o livro sobre o caso de Southington— mesmo livro que deu origem ao filme Evocando Espíritos— agora tem repúdiado o livro. Ele afirmou estar feliz com o fato do livro estar fora de catálogo e que “A Família envolvida, que na época passava por muitos problemas reais como drogas e alcoolismo, não conseguiam manter a mesma versão dos fatos e eu me tornei muito frustrado durante o processo. É muito difícil escrever uma não ficção quando as partes se contradizem” (“Ray Garton” 2009). E foi isso que deu origem ao filme “Baseado em Fatos Reais”



Referências
  • Carpenter, Bryant. 1988. Southington haunting is daunting. Record-Journal (Meriden, Connecticut), August 13.
  • Corica, Susan, and Glenn Smith. 1988a. An unworldly being. Herald Extra (New Britain, Connecticut), August 15.
  • —. 1988b. Haunted house claim clouded by tenant, landlord dispute. Herald, August 29.
  • Curran, Robert, with Jack and Janet Smurl and Ed and Lorraine Warren. 1988. The Haunted: One Family’s Nightmare. New York: St. Martin’s.
  • Dimauro, Ken, and Jeanne Starmack. 1989. Demonic presence said to plague family. Observer, August 18.
  • Duckett, Jodi. 1991. The Morning Call (Allentown, Pennsylvania), November 5, 1991.
  • I was raped by a ghost. 1992. Sally Jessy Raphael show transcript (no. 1084), Multimedia Entertainment, October 30.
  • Nickell, Joe. 1995. Entities: Angels, Spirits, Demons, and Other Alien Beings. Amherst, New York: Prometheus Books.
  • —.2006. Death of a demonologist: Ed Warren dead at 79. Skeptical Inquirer 30:6 (November/December), 8.
  • Rivard, Kathy. 1988. Southington family spooked by house. Bristol Press (Bristol, Connecticut), August 11.
  • Schmidt, Karen. 1992. Couple sees ghost; skeptics see through it. Hartford Courant, October 30.
  • Warren, Ed, Lorraine Warren, Al Snedeker, and Carmen Snedeker, with Ray Garton. 1992. In a Dark Place: The Story of a True Haunting. New York: Villard Books.
  • Wikipedia. 2009. Ray Garton. Accessed February 27, 2009.



Comentários

Anônimo disse…
Afinal essa historia foi veridica
ou não
Por favor entre em contato coigo

ch234156@gmail.com

gostaria muito de saber sua opinião
já que estudou o caso